O Brasil e o mundo, de forma consciente ou não, não têm o mínimo de noção sobre o massacre dos povos indígenas, através de nós mesmos sabem muito pouco ou nada. Sobre nós mulheres indígenas sabem menos ainda, ou alimentam em seu imaginário uma imagem folclórica e fetichista. Apenas a cruel história de que suas bisavós foram “pegadas a laço”, mas sequer sabem a origem, o povo, a etnia, nada!
Mantêm a ideia antiquada e machista de que somos submissas, incapazes ou que vivemos atrás dos cocares dos homens, que não participamos das decisões da aldeia, nas lutas e política, e apenas nos dedicamos a cuidar dos filhos. Estes estereótipos, além de falsos, fazem com que tantas conquistas por nós já vividas sejam invisibilizadas e ainda ocultam crimes contra as mulheres indígenas, as mais vulneráveis do mundo.
Dados da ONU comprovam que em cada grupo de cinco mulheres indígenas, três já foram estupradas, mais que o dobro da média nacional. Segundo o mesmo relatório, no Brasil, a maternidade adolescente indígena representa o dobro da não indígena. Mas, a força e a beleza da mulher indígena estão na resiliência e na transformação.
A partir da década de 1990, começaram a surgir nossas próprias organizações ou departamentos de mulheres dentro de organizações indígenas já estabelecidas na Amazônia Brasileira. Ao lado disso, encontros de mulheres de diferentes etnias têm acontecido nos âmbitos nacional e internacional. O que buscamos no momento atual é a reivindicação de direitos próprios da mulher e o fortalecimento de antigas lutas de nossos povos, o que faz com que tenhamos que interagir com diferentes atores no contexto interétnico.
No atual momento do movimento feminino indígena têm se realizado cada vez mais encontros, oficinas e conferências nacionais e internacionais promovidos pelas organizações indígenas, instâncias estatais e não governamentais. Estes novos espaços de discussão articulam mulheres de diferentes etnias, nos quais é expressivo o número de professoras e mulheres atuantes na área da saúde. Grandes lideranças femininas têm se levantado nesses encontros, lutando por questões específicas de nossos povos ou demais pautas da sociedade civil, inclusive no campo político-partidário também. Essa inserção na política partidária parte da necessidade de um diálogo com a sociedade não indígena.
Nós acreditamos que temos muito a ensinar e aprender com o não indígena, inclusive o número de mulheres indígenas que saem de suas aldeias para fazer um curso superior nas cidades é o triplo do número de homens, apesar de todas as dificuldades relacionadas a “gênero”.
Por falar nisso, é importante também destacar que termos utilizados nas discussões feministas não indígenas, como “empoderamento”, “gênero”, entre outros, sempre foram vividos por nós, mesmo não tendo estes conceitos em palavras. Vivemos, todos os dias, o empoderamento, questionando os papéis tradicionais desde muito jovens, e mudando o mundo ao nosso redor nas aldeias e fora delas. Dessa forma, transpomos de um campo estritamente feminista e ocidental para outra realidade que não a da mulher não indígena.
Os conceitos acadêmicos têm sido ressignificados por nós em diferentes formas de ação, e passa a ter um caráter que comunica entre as sociedades indígenas e não índias, para que dessa forma possamos participar cada vez mais ativamente das decisões políticas ao nosso redor, de forma mais geral, até porque não temos uma agenda feminista específica dentro da sociedade ocidental.
Assim, transformamos o academicismo para que ele “desse conta” das necessidades específicas das mulheres indígenas. A violência contra a mulher e o reconhecimento dos direitos reprodutivos, por exemplo, são demandas compartilhadas pelos dois movimentos, mas a experiência cotidiana vivida nas comunidades indígenas (e mesmo no espaço urbano) difere e muito da realidade das mulheres não indígenas. E por essas razões é necessário nosso maior engajamento político também, precisamos ainda mostrar que nossas lutas e vidas são valiosas e podem trazer a toda a sociedade nossa garra, força, cultura e ancestralidade.
Embora os primeiros habitantes das terras que hoje chamamos de Brasil tenham sido os indígenas, conhecemos de forma muito fragmentada a cultura indígena. As suas culturas são diferentes de acordo com as tribos e grupos e, nesse contexto, têm-se conhecimento de de 305 povos indígenas somam 896.917 pessoas e 274 línguas diferentes.
Isso ocorre porque há uma grande diversidade de povos indígenas no Brasil hoje, mesmo que vários grupos tenham desaparecido após a chegada dos europeus no território brasileiro.Por vezes a cultura indígena é representada de forma muito superficial na sociedade brasileira, utilizando-se adornos sem que nem ao menos saibamos de fato o que estes representam originalmente.
A cultura indígena é muito rica em diversidade, em significados e rituais. Conhecer um pouco mais sobre essa cultura é também valorizar os povos indígenas em sua singularidade. A cultura brasileira foi constituída a partir de uma matriz original formada pelos indígenas nativos, os negros africanos e os europeus, somando-se a isso os povos que vieram posteriormente. Assim, a cultura indígena sempre esteve nas terras do Brasil, desde as práticas alimentares, as ritualísticas até a linguagem. Muitas palavras que são usadas no nosso cotidiano são oriundas da linguagem indígena, o mesmo ocorre para nomes de rios, plantas e animais.
Assim, muitas coisas que fazemos ou gostamos hoje, foram apreendidas da cultura dos povos nativos do Brasil.
Quem é Mônica Marapara
Mônica Corrêa Marapara é graduada em Serviço Social (Universidade Luterana do Brasil-ULBRA). Motivada a atuar na gestão pública para promover a cidadania e a preservação de direitos, Marapara decidiu cursar, pós-graduação em Gestão de Politicas Públicas com Ênfase em Gênero e Raça pela Universidade Federal do Bahia. Atualmente está cursando Direito e jornalismo.
Está entre as 100 mulheres a seguir na vida, segundo a Secretaria de Justiça, Trabalho e Direitos Humanos do Estado do Paraná. Foi Subsecretaria de Assistência Social. Atuando com indígenas e não-indígenas. Diante da dificuldade de acesso à Justiça, Marapara, passou a ajudar voluntariamente as comunidades com Pareceres para Aposentadoria, Licença Maternidade e outros benefícios. Foi Diretora da FIBRAS MULHER, atuando no Planejamento de Política Públicas voltada para MULHER. Professora de Informática a seis anos e na Fundação Boi Bumbá Caprichoso, com Crianças e Adolescente em situação de Vulnerabilidade Social e três anos no Centro Tecnológico do Amazonas-CETAM com jovens e adultos. Seis anos de ONG, como vice-presidente da Nhengatu, com sede em Brasília. Ex coordenadora do Distrito Sanitária Especial Indígena DSEI-BA, com a responsabilidade de Coordenar o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS) do Ministério da Saúde, com atividades técnicas, visando medidas racionalizadas e qualificadas de atenção à saúde, promovendo a reordenação da rede de saúde e das práticas sanitárias e desenvolvendo atividades administrativo-gerenciais necessárias à prestação da assistência, com o Controle Social. Atualmente é âncora no programa de frente com Marapara Brasil.
Uma Ativista indígena assídua!!!

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